Hoje me lembrei da história que vive, como fruto de um amor, sinto-me tão bem ao lembrar,
para muitos pode parecer uma história fictícia, talvez um conto de fadas, mas eu posso garantir, foi real e verdadeiro, eu estava lá.
Ainda aos treze anos Odette abria a janelinha da porta de sua casa, para ver o seu eleito passar, ele não percebia, pois ela nas sombras se escondia.
Três anos mais velho que ela, já se julgava um homem, era ajudante de ferramenteiro nada ganhava,
apenas uns safanões se não prestasse atenção, estava ali para aprender, assim era naquela época, a nona, sua mãe dava “grazie ao Dio” por ter conseguido a vaga de aprendiz para ele.
Quantos sonhos entrará para o SENAI, estudaria ferramentaria e também desenho mecânico, uma oportunidade e tanto, poucos tinham a chance e ele só estudara até o quarto ano primário, mas era muito dedicado, iria conseguir.
Namorar, não por enquanto só flertar, e de preferência meninas fora do bairro, para não pegar mal. Assim passaram-se alguns anos, ele já percebera a menina que todo dia o aguardava, mas fazia que não via, ela era de família, e depois seu coração batia muito forte quando a via, aqueles olhos verdes rasgavam-lhe a alma, ela não podia perceber, senão estaria em suas mãos.
Bem, tentou fugir não deu, ela não saia de sua cabeça, sabia que a menina não namorava ninguém,
nem flerte ela aceitava, nas domingueiras a todos recusava, e quando ele se aproximava, seus olhos ela abaixava, as faces ficavam rubras, e de repente os dois só gaguejavam.
Não podia ser diferente, o amor era puro, sincero, e Giordano e Odette, em um quatro de setembro, tornaram-se marido e mulher. A luta foi muito grande, vocês nem imaginam, a mãe de Giordano não queria uma neta de italianos, estava de olho em uma italiana pura, saída do forno. Nunca se conformou, vivia na casa da nora, eram vizinhas, fuxicava o que podia, aumentava e dava a entender, todo dia era assim, Dete não limpa casa, a comida não é boa, não cuida das crianças, e exigia atitudes dele.
Nossa demorou bem uns quinze anos para se mudarem para longe dela, e só aí é que Giordano se deu conta de como a mãe inventava, longe viviam em paz.
Tiveram quatro meninas e um menino, eu sou a terceira filha, imaginem se a nona não aprontou uma briga quando soube que eu vinha, coitada, no início nem na cara me olhava, um dia me segurando no colo, ela foi com tudo pro chão, quebrou o nariz. Até Giordano disse, é mãe a senhora não a queria.
Giordano se formou antes de se casar, a mãe lhe emprestou dinheiro para comprar um torno, em troca de que em cinco anos colocasse o irmão mais novo como sócio, ele aceitou, queria progredir.
E progrediu, com muita luta um dia percebeu que ganharia mais se comprasse uma mula manca, (máquina de injeção de plástico), havia guardado dinheiro, adivinhem seu irmão agora sócio e seus pais, aprontaram a maior revolta, e ele não ouviu e quando menos esperavam, a tal mula manca foi entregue.
Em poucos anos ganharam a confiança do mercado, fabricavam para as metalúrgicas, e haviam conseguido a Brasilit, a Eternit e a Duratex então Deca, aos poucos começaram a fabricar a linha para lojas de material de construção, e o deslanche foi automático, uma coisa puxava a outra.
Odette ali, firme forte, ao lado de seu adorado Nano, vocês não imaginam como era o amor deles, ela o apoiava em tudo, muito simples, ingênua mesmo, com um coração que abrangia a todos, não via maldade em ninguém, costumava disser que “ todos nesta vida vem para pagar alguma coisa, mas eu não precisei pagar nada, tudo o que quero é meu Giordano e tenho”, isto depois de vinte e cinco anos de casado.
Fui secretária de meu pai, trabalhei lado a lado, anos a fio, íamos e vínhamos juntos para o trabalho, o dia que ele esquecia de dar um beijo nela ao sair, ele me dizia, Má corre liga pra mamãe e me passa a ligação, ela está triste eu esqueci de beijá-la.
Assim eles eram, quando papai chegava do trabalho, mamãe já com a janta pronta, subia as escadas com ele, e ficavam a confabular, no banheiro tinha uma cadeira que ela sentava e enquanto ele tomava banho, contavam as novidades do dia.
Nossa o amor se sentia no ar, era uma vida rotineira, às vezes interrompida com este ou aquele fato, triste ou alegre, mas tudo era resolvido, e voltava-se ao normal, éramos tão unidos. Mesmo depois quando as filhas foram casando e acabou ficando só o menino, raspa de tacho, orgulho deles.
Giordano mais uma vez iniciou um empreendimento contra a vontade de seu irmão, a fábrica pequena, não suportava mais máquinas, estavam já com sessenta funcionários, e estavam num bairro que era comercial e residencial, pagavam todo ano certa quantia para a fiscalização não denunciar. Ele não teve dúvidas, comprou um terreno em local próximo, mas zona fabril, e começou a projetar a nova fábrica, seu irmão não quis saber dos projetos, era contra, tinha medo de mudar e se de repente os pedidos caírem. Giordano fez tudo sozinho, contratou engenheiro, juntos fizeram a planta e depois a construção, enorme, também foi já comprando máquinas modernas automáticas, e seu irmão de nada participava, dizia não querer saber.
Bem ele concluiu o projeto, iria mudar a fábrica aos poucos, não poderia paralisá-la, os prejuízos seriam imensos, calculou que levaria quase um mês para a mudança de tudo. Mas os projetos estavam em sua cabeça, seu irmão não queria saber, e nas vésperas de iniciar a mudança, de instalar a primeira máquina, Giordano vítima de um infarto do miocárdio fulminante faleceu.
Imaginem o desespero nosso, a dor, e Odette, que apenas falou “ agora filha começou o meu resgate,
e só terminará no dia que eu ir ao seu encontro através da grande viagem”.
A mudança da fábrica? Ah adiaram por um ano, o Luiz irmão de Giordano precisou contratar um acessor para aprender a lidar com a parte que Giordano lidava. Luiz sempre foi um homem muito trabalhador, era o primeiro a chegar e o último a sair, mas nunca se interessou pela parte administrativa, ficava nervoso porque Giordano participava das decisões referentes a produção, sentia-se diminuído, não sei porque pois sempre ficou bem claro que Luiz era um gênio no que fazia. Contudo no que se referia a decisões administrativas, ele se escusava, não queria tomar parte, e disso sou testemunha, muitas vezes o vi dizendo vocês resolvam, virava as costas e voltava para dentro da fábrica.
Bem, Odette permaneceu sem o seu Nano por nove anos, vítima de cirrose devido a uma hepatite que não sabia que tinha, após seis meses de luta, atravessou a ponte, deixando-nos repletos de saudades.
O exemplo de vida de Dette e Nano, gente simples, sem maldade, doadores naturais de amor que no anonimato muitas sementes de amor espalharam, a muitos ajudaram sem nada falar, sem fazer alarde. Nós seus filhos só descobrimos depois que eles haviam feito a grande viagem, quando alguns nos procuraram contando-nos suas histórias oferecendo a nós sincera amizade, como única forma que encontraram para agradecer os grandes amigos, e digo a vocês a maioria gente humilde de pouco poder aquisitivo, mas com um coração repleto de gratidão.
Mamãe, papai vocês foram nesta terra, gente em todos os sentidos da palavra, e eu quero gritar ao mundo o quanto os amo, e um dia quando atravessar a ponte sei que estarão ali de mãos estendidas para me guiar no novo lar.
Luconi
27-11-09
NÃO TEM COMO HOMENAGEAR MEU PAI SEM HOMENAGEAR MINHA MÃE, PARA MIM UM ESTÁ UNIDO AO OUTRO.
AMO VOCÊS SEMPRE